segunda-feira, 29 de outubro de 2012

Ainda em Paris: Gourmard

Gourmard – Chef Philippe Dubois (1 estrela no Guia Michelin)

Foi por acaso que descobri este lugar, fuçando no Guia Michelin quando procurava por um restaurante estrelado perto do meu hotel. Não tinha conseguido reservar o Taillevent nem o Le Tour D’Argent para esta noite e não me restavam opções senão telefonar para tentar uma reserva em algum lugar bacaninha. No final das contas, este restaurante se tornou uma grata surpresa para nós, tanto pelo ambiente quanto pela sua cozinha.

Da rua não se tem a exata noção do estilo, já que o salão principal fica no andar de cima. Embaixo, somente a recepção, boulangerie (própria) e cozinha. Logo que se chega ao meio da escada já é possível notar traços da decoração ultra moderna, em tons escuros, com iluminação arquitetural e indireta. São dois salões com mesas bem próximas, sofás em veludo escuro, cortinas e espelhos pretos, lustres de cristal. A freqüência é de Parisienses em sua maioria, não vi turistas, com exceção de dois executivos na mesa ao lado, falando em inglês.

A cozinha do chef Philippe Dubois tem ênfase nos peixes e frutos do mar – há um bar de ostras, que aliás, faz parte da cultura parisiense, eles adoram a iguaria e entendem muito do assunto. Descobri que há diferentes variações de ostras, inclusive divididas de acordo com critérios como concentração de iodo, aroma de nozes ou seu terroir (!). Confesso que prefiro ostras em preparações quentes (fritas, gratinadas ou como ingrediente de massas e risotos), mas não sou muito fã da versão in natura, direto da concha (pronto, podem me linchar virtualmente, sei que serei massacrada pela confissão), por isso não pedi o prato com 6 ou 12 unidades. Mas recomendo para quem gosta, porque o aspecto visual era incrível, nunca vi ostras tão grandes!

Enquanto escolhíamos, fiquei entretida com o amuse bouche, um patê de bacalhau bem gelado com torradinhas de baguette na manteiga. A manteiga é sempre ótima, seja pura ou aromatizada, não tem manteiga ruim na França – nem pão, são sempre excelentes, portanto qualquer couvert é uma atração.

Para começar, escolhi o salmão marinado por 24h com creme de wasabi. Para variar, minha mãe que não gosta dos amigos do mar ficou com a única opção que lhe restava, a famigerada salada verde. Para o prato principal, escolhi um peixe que não conhecia (talvez o nome em português seja Pregado, mas não estou certa) acompanhado de risotto de rúcula. Mamãe foi de carne de novo...zzzzz, um medalhão de filé mignon com batatas e cogumelos. Vocês irão notar, ao longo dos diversos posts sobre a França, que costumo escolher muitos pratos que levam peixes e frutos do mar. Isso porque valorizo a cultura deles de consumir apenas o que é fresco, praticamente tudo é pescado no mesmo dia, com uma logística eficiente de entregas em todas as regiões distantes do litoral (é o caso de Paris, por exemplo). Nada é congelado e aquilo que não é consumido no dia vai para o lixo – pelo menos nos restaurantes de alto nível. Isso quem me afirmou foi meu professor, um chef de cozinha que teve como formação o hotel Ritz de Paris, profundo conhecedor da gastronomia francesa, principalmente dos bastidores.

Obs.: Comecei a escrever este post no trem a caminho de Lyon, justamente quando meu celular resolveu seguir viagem sem mim. Com isto, justifico que este post não terá fotos... se bem que fotos de celular não são apreciadas pelos leitores deste blog, por isso prometo que os próximos terão fotos de alta qualidade, feitas com minha câmera semi-profissional, aquela que minha mãe morre de vergonha quando eu tiro da bolsa para fotografar os pratos... tudo em prol da qualidade de informação para você, leitor!

O salmão marinado veio em nacos carnudos e macios, tão brilhante como um peixe fresquíssimo deve ser. A marinada era muito leve e o creme de wasabi dava potência ao prato, acompanhado de salada de folhas diversas temperadas com azeite virgem e mostarda Dijon.

O prato principal veio em uma panelinha de ferro (cocotte), com o filé de peixe sobre o risotto. Apesar de não ser uma especialidade dos franceses, o risotto estava perfeito em termos de sabor e textura. O peixe, como sempre, fresco e no ponto ideal, com interior macio e suculento e exterior levemente crocante. O que pode não agradar é a quantidade, já que a cozinha francesa é conhecida por suas pequenas porções e até para um leitor novato fica fácil perceber que sou uma verdadeira glutona. Confesso que fico com receio de sentir fome, mas até agora não precisei pedir outro prato ou passar na boulangerie ao lado do hotel para comprar um sanduíche para a ceia... por isso que os franceses são magros, além de comer pouco, andam muito a pé e a comida em si tem menos sal, nosso paladar está mal acostumado - talvez seja culpa do nosso amado hábito de fazer churrasco, a quantidade de sal grosso que utilizamos em uma peça de picanha deve ser o que eles consomem aqui em uma semana...

Mais uma vez passei vontade quando vi um prato de vieiras sendo servido na mesa ao lado. Além do steak tartare, agora precisaria saciar o desejo de vieiras, aqui conhecidas como Coquilles Saint Jacques. Desejos se acumulando, isso me preocupa...

Para acompanhar, seguimos as sugestões dos vinhos em taça que estavam ao lado de cada prato do menu: um Chardonnay para a entrada e um Saint Joseph do Rhône para o principal, ambos ótimos e servidos na temperatura ideal.

De sobremesa, mamãe escolheu um Gateau Basque, um bolinho com figos. Pela primeira vez um desapontamento com a sobremesa, o bolinho era seco e desinteressante, nem o ótimo chantilly conseguiu salvar... não quis sobremesa dessa vez, tinha me entupido dos ótimos macarons do café Angelina naquela tarde e meu limite para doces é baixíssimo. Aliás, se minha opinião sobre macarons interessar a alguém, os do café Angelina são muito melhores que os da Fauchon e da Ladurée juntos. Estas duas são verdadeiras grifes gastronômicas, mas em termos de doces e na minha modesta opinião, o café Angelina é imbatível.Tudo aquilo que se torna muito famoso e vira grife internacionalmente conhecido pode correr o risco de perder a qualidade no processo de produção, devido à larga escala necessária para atender a demanda em constante crescimento. É impossível manter a qualidade do produto final, fabricado artesanalmente, quando se passa a produzi-lo de maneira industrial. Ponto para o Café Angelina, que ocupa o mesmo salão na Rue de Rivoli há mais de 100 anos...

Em termos de valores, a conta no Gourmard deu um total de 160 euros. Mais uma boa opção em Paris com ótima relação custo x benefício, ainda mais em se tratando de um restaurante com uma estrelinha no Guia Michelin. Recomendadíssimo pelo M.O.Q.B!

Gourmard
9, Rue Duphot - 75001 Paris
Tel: 33 1 42 60 36 07
www.gourmard.com



4 comentários:

  1. Ah, nem vem, já passei muita vergonha com você, pode tratar de sacar o canhão que eu quero ver foto bonita.

    ResponderExcluir
  2. Ahahahaha... pode deixar, Miguel, já entrei no esquema, tô tirando mais fotos que turista japonês, nem aí pra cara blasé dos franceses...

    ResponderExcluir
  3. Eu não tenho essa sofisticação e categoria da Mari, tanto pra apreciar os bons pratos/vinhos, quanto pra descrever com perfeição - ao ponto de deixar a gente com a sensação de água na boca. Mas eu vou fazer questão de começar a divulgar o blog pra todo mundo Mari, tá bom demais! Parabéns!

    "Segunda" eu tô de volta!

    ResponderExcluir
  4. Valeu, André! Vindo de um leitor que acompanha o blog desde os primórdios, tem muito mais valor... lamento pela volta à segunda - NOT! Abs.!

    ResponderExcluir